Eles combatem corrupção eleitoral, pandemia e discriminação
Por Andréa Ascenção, Catiane Santos e Otávio Augusto Rodrigues
Servidores públicos são como óleo para a máquina do Estado. Com o app Pardal e o Sistema de Alerta de Desinformação Contra as Eleições 2022, inibem a corrosão que ameaça a democracia. Já por meio da plataforma De Olho na Fila, atuam na manutenção da vida útil de cada componente da sociedade. Das engrenagens da educação pública, eles também projetam Incluir para Evoluir.
Neste 28 de Outubro, Dia do Servidor Público, a AFPESP apresenta exemplos de potência da máquina do Estado. Confira abaixo quem está por trás do funcionamento de serviços públicos inovadores.
Eleições Gerais de 2022: sistemas combatem irregularidades e desinformação
Quando a propaganda eleitoral dos candidatos que disputam as eleições de 2022 iniciou oficialmente, no dia 16 de agosto, o aplicativo Pardal, da Justiça Eleitoral, foi reativado para que qualquer cidadão possa denunciar: propaganda eleitoral irregular, compra de votos, uso da força da máquina pública em benefício de candidaturas e outros crimes eleitorais.
Ao baixar o aplicativo, disponível para sistemas Android e iOS, cidadãos devem enviar provas da suposta irregularidade, ou seja, fotos, áudios e/ou vídeos. A apuração das denúncias inicia com um promotor integrante do Ministério Público Estadual. Se houver indícios concretos de irregularidades, o caso é encaminhado ao procurador regional Eleitoral ou, se a denúncia for relativa às eleições presidenciais, ao procurador-geral Eleitoral.
De acordo com dados publicados no site do Tribunal Superior Eleitoral, até o dia 24 de outubro, às vésperas do segundo turno, o aplicativo Pardal recebeu 43.074 denúncias relativas às Eleições Gerais de 2022. Com 6.268 registros, o estado de São Paulo lidera o número de queixas.
Ao todo, as denúncias recebidas pelo aplicativo deram origem a 12.352 processos que estão em tramitação no Processo Judicial Eletrônico da Justiça Eleitoral, o que corresponde a aproximadamente 26% dos processos atuais.
“É importante que a população esteja consciente desse papel que ela tem porque os maiores fiscais são os cidadãos, para que nós possamos fazer uma eleição transparente, respeitando as regras, a questão de não abusarmos do direito de concorrer livremente a cargos eletivos”, ponderou a juíza do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios Ana Loiola, em entrevista para Fábio Ruas, exibida, no dia 23 de setembro, no podcast Clica e Confirma.
Junto a outros dois juízes, Ana explicou que integra a Coordenação de Fiscalização da Propaganda Eleitoral (Cofpe). “Nós estamos aqui não só para fiscalizar, mas também para auxiliar a população nesse momento tão importante. A nossa competência é fazer o controle e a fiscalização da propaganda sob o aspecto de meio e forma. Às vezes a pessoa está passando por uma praça e vê que tem uma propaganda irregular. Por exemplo, uma bandeira fincada no chão. É importante que ao fazer a denúncia, a pessoa traga uma prova para que a gente consiga entender o que ela está falando, qual é a localidade, de que maneira irregular essa propaganda está sendo feita. Se, pela prova que a pessoa envia, nós conseguirmos identificar que aquilo ali é uma propaganda irregular, na hora nós aqui da Cofpe, os juízes, os servidores que trabalham conosco quando está muito cheio, já entramos em contato com o candidato, mas eu faço questão de ligar, explicar que aquela propaganda é irregular, para que ele retire imediatamente.”
Durante a entrevista Ana esclareceu que também pode agir de maneira peremptória: “Por exemplo, trio elétrico é vedado pela resolução nº 23.610 do TSE [Tribunal Superior Eleitoral]. Só pode carro de som com o candidato acompanhando. A notificação é feita para que o candidato retire em até 24 horas, mas nós temos esse poder de mandar apreender esse veículo na hora; porque é proibido; além da multa.
Outra funcionalidade da tecnologia Pardal é permitir que os cidadãos possam visualizar a tramitação da denúncia. “O denunciante acompanha no Pardal as providências que nós estamos tomando em tempo real”, contou Ana.
Tecnologia a serviço da informação
A Justiça Eleitoral também disponibiliza um canal batizado de Sistema de Alerta de Desinformação Contra as Eleições 2022 a fim de agilizar o combate à propagação de narrativas falsas, que possam prejudicar a democracia no Brasil.
Basta acessar esta página para registrar uma queixa. Diferentemente do aplicativo Pardal, o sistema se destina a denúncias de fake news sobre urnas e o trabalho realizado pela Justiça Eleitoral; violações específicas de termos de uso de plataformas digitais, como discurso violento ou odioso e violência política de gênero, e disparo em massa, que é caracterizado pelo envio ou encaminhamento de mensagem eleitoral não solicitada por meio de aplicativos de conversação.
Após o registro no sistema, as denúncias são repassadas às plataformas digitais e agências de checagem parceiras da Corte Eleitoral no Programa de Enfrentamento à Desinformação para rápida contenção do impacto provocado pela a disseminação desse conteúdo na internet. Em último caso, dependendo da gravidade do relato registrado no sistema, a denúncia pode ser encaminhada ao Ministério Público Eleitoral e demais autoridades para adoção das medidas legais cabíveis.
De Olho na Fila: ideia inovadora nasce em cenário alarmante
Logo nos primeiros dias da campanha de vacinação contra a Covid-19, o desespero da população por uma dose de imunizantes recém-chegados ainda em janeiro de 2021 era tanto que filas e mais filas se formavam diante dos postos de vacinação em São Paulo.
O problema, no entanto, não parava por aí. Além da superlotação, era comum encontrar pessoas que depois de horas esperando nas filas de UBSs (Unidades Básicas de Saúde), hospitais e postos volantes voltavam para casa sem a imunização, pois não havia doses suficientes para atender a alta demanda.
Como proceder, então? Onde encontrar vacina? Será que conseguirei minha dose? Foram questionamentos comuns na época, que Felipe Neves — servidor público e diretor do Departamento de Tecnologia da Informação e Comunicação da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo (SMS) — também fez a si mesmo e decidiu agir.
“No meio da pandemia, logo quando a vacina chegou, nós [da SMS] chegamos a procurar algumas soluções para o munícipe não ficar tanto tempo esperando nas filas. Começamos a pesquisar se já existia algum produto parecido no mercado, mas não existia. Então, falei para bolarmos alguma coisa aqui”, relata o servidor.
Com muito trabalho e dedicação, como explicou Felipe, em seis meses, nasceu o “De Olho na Fila”, site que compartilha informações, em tempo real, sobre a lotação e disponibilidade de imunizantes em postos de vacinação de São Paulo. Os dados são fornecidos pelos funcionários das unidades de saúde.
Em seus primeiros 45 dias em funcionamento, a plataforma obteve cerca de 14 milhões de acessos. Atualmente, com mais de 54 milhões, o projeto alcançou seu propósito e rendeu a Felipe o reconhecimento no 3º Prêmio Gente que Faz a Diferença, promovido pela Coordenadoria de Gestão de Pessoas (Cogep).
“O que me motiva é ajudar as pessoas sempre. É saber que de um modo, ou de outro, nós conseguimos contribuir em um momento tão difícil. Sou filho de servidora pública. Meu sonho sempre foi ser servidor público também. Como o nome 'servidor público' diz, temos que servir às pessoas”, completa Felipe.
Segundo os levantamentos semanais “Vacinômetro” e “Boletim Covid-19”, divulgados na terça-feira (25), pela SMS, mais de 36 milhões de doses foram aplicadas em São Paulo. Desde o início da pandemia no Brasil, o município registrou 2.298.887 casos confirmados e 44.067 óbitos.
Antes do início da vacinação, o número de mortes por Covid-19 chegou a 190 em um único dia. Após a vacinação ter começado, durante o período da “segunda onda da Covid-19”, o pico de óbitos foi de 393. Atualmente, com 107,6% da cobertura vacinal completa aplicada no município (100% se refere aos paulistanos e 7,6% à população de outros estados e municípios que se vacinaram em São Paulo), a média móvel semanal de óbitos passou para uma pessoa.
Incluir para Evoluir capacita jovens com deficiência
Há dois anos a servidora pública Marcia Carfer vem trilhando uma trajetória que está ajudando a mudar o futuro de muitos jovens. Desde 2020 ela assume uma missão: inserir pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
Como professora de ensino médio e técnico pelo Centro Paula Souza (CPS) no litoral paulista, e com uma das formações em neuropsicopedagogia, Marcia deparou com uma situação nova em 2019 ao lecionar para um aluno com deficiência visual na Etec Dra. Ruth Cardoso. O jovem, na época, formou-se como técnico em logística e na sequência como técnico em administração.
“Acho que ele foi o pontapé para mim. Assim que começou a pandemia em 2020 eu pensei em uma maneira de fazer com que outros jovens com deficiência também alcançassem o que aquele jovem da Etec Santos me mostrou ser possível”, lembra Marcia.
Foi, então, que surgiu o projeto “Incluir para Evoluir”, no qual jovens entre 14 e 24 anos, e com algum tipo de deficiência (com ou sem laudo), receberiam uma formação de qualificação profissional para o mercado de trabalho. No período de flexibilização da pandemia Marcia já estava com uma turma de 16 alunos.
O trabalho foi ampliado e novas turmas surgiram. Mesmo com o aumento da demanda, Marcia não desanimou e se manteve responsável por todos os processos para garantir o sucesso do projeto. “Sou eu quem faz todo o processo: captação, elaboração do plano, acompanhamento, atividades adaptadas em parceria com os professores voluntários e encaminhamento para o mercado de trabalho por meio de parceria com empresas da região”, explica.
O projeto foi reconhecido por promover educação inclusiva e já coleciona o Prêmio Humanidades Projeto de Vida Inclusivo, da Universidade de São Paulo (USP); o Prêmio Agente de Inovação, do CPS, e Gerando Falcões, da ONG homônima; além dos títulos de Mulher Caiçara e Cidadã Vicentina, que serão entregues em novembro.
Como funciona
O trabalho realizado consiste em um treinamento de 100 horas, sendo 40 horas de preparatório para o mercado e 60 horas de especialização. Todo o conteúdo é adaptado de acordo com a necessidade de desenvolvimento de cada participante.
“Eu acompanho esse jovem até o momento da entrevista. Depois ele tem a opção de continuar fazendo outros cursos para aprimorar o conhecimento dele ou se desligar”, conta Marcia.
São atendidos jovens de São Vicente, Santos, Praia Grande e Cubatão. Os alunos são indicados pela Associação de Mães Especiais Filhos Especiais (Amefe) e depois recebem uma avaliação diagnóstica. Aqueles que porventura não conseguem ser inseridos em alguma empresa são trabalhados de outra maneira, por meio das competências socioemocionais. “Ninguém é descartado”, enfatiza a servidora pública.
Com o tempo, o projeto “Incluir para Evoluir” cresceu e Marcia criou o “Instituto PertenSer Carfer”, onde além de orientar os jovens de 14 a 24 anos, passou também a atender crianças de 2 a 12 anos.
A necessidade surgiu ao perceber que muitos não sabiam ler e escrever – funções básicas requisitadas no mercado de trabalho. Ao ampliar a faixa etária Marcia e sua equipe conseguem ajudar esses jovens desde o início da educação formal.
Atualmente há 24 vagas: 12 de preparatório emocional (focado no empreendedorismo) e 12 de preparatório profissional. O atendimento é feito em uma das salas da Associação Comercial de São Vicente, um dos parceiros do instituto.
Seja na Justiça Eleitoral, na Secretaria Municipal de Saúde, no Centro Paula Souza ou em qualquer outro órgão público, servidores atuam como transmissores de força para o funcionamento do Estado, que por sua vez passa a oferecer novas soluções diante das adversidades de tempos modernos.