Por Dimas Ramalho
O fortalecimento da democracia brasileira, por meio de seu rito maior — o voto direto, secreto e universal —, não é missão exclusiva da Justiça Eleitoral, ramo especializado do Judiciário que, essencialmente, concentra funções jurisdicionais, administrativas, normativas e consultivas. Outras instituições públicas, além da própria sociedade civil organizada, ajudam a garantir que a escolha dos representantes políticos seja realizada de maneira limpa, justa e periódica.
Nesse sentido, cabe destacar a atuação dos tribunais de contas. Nos termos apregoados pela Constituição e pela lei, esses organismos, embora primordialmente voltados ao controle dos gastos públicos, assumem papel de relevo na consecução do processo eleitoral.
Conforme a Lei Federal nº 9.504/97, a Lei de Eleições, compete aos tribunais de contas encaminhar à Justiça Eleitoral uma lista de inelegíveis. A regra determina que seja informada a relação dos cidadãos que, no exercício de cargos ou funções públicas, tiveram suas contas rejeitadas por irregularidade insanável e decisão irrecorrível.
De acordo com a Lei Complementar nº 64/90, que expressa as condutas que levam à inclusão dos responsáveis na referida lista, os gestores públicos censurados com a reprovação de contas somente serão alcançados pela inelegibilidade se forem, também, condenados a ressarcir o erário (Lei Complementar nº 184/21). Em outras palavras, integrarão a relação de apenados apenas aqueles a quem for imputado débito, em razão de dano ao patrimônio público.
Como se vê, os tribunais de contas cumprem papel crucial na definição dos postulantes a cargos políticos, impedindo que indivíduos que lesaram a coisa pública possam se oferecer como candidatos.
A participação dos órgãos de controle externo não se esgota, contudo, nesse filtro de maus gestores. O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, por exemplo, renova a cada biênio um acordo de cooperação com o Tribunal Regional Eleitoral respectivo, por meio do qual se compromete a auxiliar nos exames de prestação de contas dos candidatos.
Assim, os servidores do tribunal emprestam sua expertise técnica à Justiça Eleitoral, e eventuais irregularidades detectadas durante a análise da prestação das contas das campanhas podem levar à não diplomação do candidato eleito.
Mais recentemente, as cortes de contas também atuaram nos testes de integridade e conformidade das urnas eletrônicas.
O Tribunal de Contas da União, por ocasião do pleito de 2022, promoveu uma grande auditoria no procedimento de votação. Dividida em 6 etapas, a fiscalização empreendida revelou, nas palavras do atual Presidente do TCU, ministro Bruno Dantas, que “primeiro, as urnas eletrônicas são auditáveis. Segundo, as urnas eletrônicas são confiáveis. Terceiro: as urnas eletrônicas são transparentes” (TC-014.328/2021-6).
A convite do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de São Paulo, a Corte de Contas Paulista também tomou parte nos testes de confiabilidade das urnas. Em razão dessa parceria, tive a oportunidade de externar que nossa Corte de Contas confirma a estabilidade do processo eleitoral e atesta a confiança no resultado do pleito.
Não resta dúvida, portanto, da importância dos tribunais de contas na engrenagem institucional que garante o respeito à vontade do eleitor. Aproximando-se as eleições municipais de 2024, o sistema constitucional de controle externo está, mais uma vez, pronto para exercer as competências que a lei lhe confiou e renovar seu compromisso perene com a estabilidade democrática.
Dimas Ramalho é procurador de justiça e conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), instituição na qual foi presidente entre 2016 e 2022. Ramalho também acumula três mandatos como deputado federal e três como deputado estadual, além de ter atuado como secretário de Habitação do Estado de São Paulo e secretário de Serviços do município de São Paulo. |